sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Charlie e meio

O Maio de 1968 deu ao mundo e à França, entre outras coisas, o 'Charlie Hebdo' e o 'Libération'. E deu à esquerda europeia uma nova via (que não a terceira), moderna, culta e expansionista. Foi no Maio de 68 que nasceu o PS português e que se deram as revoltas estudantis em França e com mais relevo em Portugal, em Coimbra. Reivindicavam a liberdade de expressão e de imprensa e de acesso à cultura, reivindicavam as liberdades de um Estado de Direito, com igualdade de oportunidades para todos. No século 21 a igualdade de oportunidades continua por alcançar, principalmente em Portugal.
O atentado ao 'Charlie Hebdo' teve no entanto o condão de pôr toda a gente a falar de liberdade de expressão e de imprensa. Mesmo para quem não sabia o que era. Aliás, diga-se de passagem, que os terroristas conseguiram tudo o que não deviam querer. Os cartoons do 'Charlie Hebdo' foram exponenciados ao infinito, o mundo uniu-se em torno da liberdade de expressão e de imprensa.
No entanto, e porque é sempre necessário algum distanciamento, a verdade é que muitos dos cartoons do 'Charlie Hebdo' roçavam e ultrapassavam mesmo o limite da provocação e do insulto. Não me refiro em específico aos relacionados com o Islamismo, porque a sátira era dirigida em todas as direcções, mas vi hoje um relativo ao 25 de Abril de 1974 em Portugal, em que se representa um padre a fazer a saudação nazi. Não, não tiveram o que mereceram, esses assuntos resolvem-se em Tribunal, ao contrário do fazem e pensam os extremistas. E essa é a grande diferença entre quem acredita na liberdade e quem faz da religião um meio para a barbárie. E que não são a esmagadora maioria dos islamitas. É outra lição a tirar dos ataques de Paris. Os radicais terroristas eram cidadãos franceses. Europeus.
Já agora, se quiserem um exemplo de radicalismo, extremismo e populismo basta ouvir as declarações e as propostas de Marine Le Pén e da sua Frente Nacional, que tentando tirar dividendos políticos da desgraça, cavalga a onda da xenofobia e até já propôs a pena de morte.
Se quisermos ir mesmo ao cerne da questão, é estudar a história da criação do Estado de Israel e todos os sucessivos atropelos ao direito internacional que ainda hoje se mantêm. O povo judeu foi dos mais massacrados no século passado, o povo palestiniano também, curiosamente as vítimas viraram opressores. Com isto não quero dizer que os fins justificam os meios. Mas um rastilho aceso leva sempre a uma bomba e um terrorista será sempre um terrorista, criminoso cobarde.
Para fechar de vez o tema, e porque já fui 'bombardeado' com horas intermináveis de directos sobre o extremismo islâmico e especialistas que nascem como cogumelos deixo só umas pequenas afirmações/interrogações:

- O Correio da Manhã é um exemplo de liberdade de imprensa!
- Em Portugal já morreram quase meia dúzia de portugueses devido a abandono pelos serviços médicos e o assunto deixou de merecer qualquer importância!
- Em dois dias as televisões portuguesas já dedicaram mais horas de informação ao extremismo islâmico do que deram ao longo do último ano ao massacre palestiniano ou à guerra no Iraque e na Síria e aos 300.000 sírios mortos, sem falar dos deslocados e refugiados!
- José Sócrates tem ou não direito a dar uma entrevista? Tem liberdade de expressão e de defesa pública ou não?



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