terça-feira, 25 de novembro de 2014

Novas oportunidades

Código de Processo Penal
PARTE I
LIVRO IV - Das medidas de coacção e de garantia patrimonial
TÍTULO II - Das medidas de coacção
CAPÍTULO II - Das condições de aplicação das medidas

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Artigo 204.º - Requisitos gerais

Nenhuma medida de coacção, à excepção da prevista no artigo 196.º, pode ser aplicada se em concreto se não verificar, no momento da aplicação da medida: 
a) Fuga ou perigo de fuga; 
b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; ou 
c) Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a actividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e a tranquilidade públicas.

A última e a mais excepcional medida de coacção parece transformar-se em Portugal numa coisa normal... Não gosto de justiceiros e muito menos dos que usam o mediatismo para umas coisas e ocultem deliberadamente outras. Para revelar em comunicados os crimes indiciados e os nomes dos visados na operação Marquês (gostava de conhecer o imaginativo autor dos nomes atribuídos às operações), não houve pudor quanto ao segredo de justiça; para ocultar deliberadamente os fundamentos da aplicação da prisão preventiva já se utiliza o segredo de justiça. O segredo de justiça já se sabe que é uma treta, dependendo de quem é o arguido, acabe-se pois com o segredo de justiça. Não tenho dúvidas de que existem fortes indícios contra Sócrates, e apesar da presunção de inocência o contraditório ficará adiado durante anos até uma eventual condenação ou absolvição. Não lhe faço aqui defesa. Não é indiferente para ninguém a figura de Sócrates, gera ódios e paixões só ao nível do futebol clubite. Espero mesmo que a Justiça e a investigação tenham um caso sólido porque senão o descrédito será total. E se no fim for julgado culpado, que cumpra a pena em conformidade. Sei no entanto, que mesmo que seja absolvido nunca será inocente aos olhos da opinião pública, tal como nunca o foi nestes últimos anos. O julgamento político volto a repeti-lo: na minha opinião Sócrates foi o melhor primeiro Ministro da democracia em Portugal, independentemente do resto. Mesmo se comparando por exclusão de hipóteses. Basta atentar nos dois que o antecederam e no actual...
A minha estranheza e até indignação é dirigida aos justiceiros com responsabilidades no foro que fazem análises de culpa formada em pleno inquérito. A partir do momento em que me disseram por comunicado quais eram os crimes indiciados e quem eram os arguidos, exigo saber enquanto cidadão quais os fundamentos para a aplicação da prisão preventiva e quais dos referidos no artigo acima estarão em questão e porquê. E também exigo explicação para a diferença entre a aplicação pelo mesmo juiz desta medida a Sócrates e as aplicadas a Ricardo Salgado por um lado e ao director do SEF, ao presidente do Instituto dos Registos e Notariado e à secretária geral do ministério da Justiça no caso dos vistos e que têm a possibilidade prévia de serem sujeitos a prisão domiciliária com pulseira electrónica. Quero saber para memória futura quando for defensor de um qualquer cidadão comum no exercício da minha profissão... Dizem que é uma crise do regime, eu digo que pode ser uma nova oportunidade...

P.S.- O Cavaco já se safou da condecoração...

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

A cobra

Enquanto se espera pela comunicação ao país do presidente da Repúb... perdão, do DCIAP em directo há três horas, que deslindem o que já antecipo, ou seja, a aplicação da medida de coacção a Sócrates de prisão preventiva, a RTPI resolve convidar uma 'apresentadora' desbocada para comentar o caso.
A fazer lembrar a pose para a fotografia dos caçadores com o pé sobre o cadáver destroçado da presa. Aliás a sua língua viperina e suja, destilada de veneno sedento de vingança, a todos atinge sem pudor, com considerações sentenciadas de dislate difamatório e injurioso. Desde o ex-PGR, a Pedroso, a sua língua só tem comparação com o tamanho da sua boca. Foi por isso que deixei de ver o 'Quem quer ser milionário'. O serviço público hoje ofereceu a 'revancha' que todos os vampiros queriam ver e que a 'cobra' ansiava provar... Espero que também a justiça lhe seja feita, muito além de ter sido despromovida a apresentadora patrocinada pelo canal público.

P.S.- A comunicação afinal foi antecipada pelo advogado... A que já esperava com tanta espera...

sábado, 22 de novembro de 2014

O legado de Sócrates

O julgamento a Sócrates tem anos de praça pública. O caso Freeport assou-o em lume brando com novos desenvolvimentos sempre que se aproximavam eleições. Nunca escondi a minha análise puramente política ao seu legado, o primeiro governo de José Sócrates foi o melhor da nossa democracia, (como exemplo, foi nesse governo que acabaram as subvenções vitalícias a ex-políticos, e que agora desaparecerão da ordem do dia tal como a gaiola dourada dos vistos). O resto é naturalmente com a justiça, acima da qual ninguém deve estar, ou para citar a desbocada e com tiques fascizóides da 'sinistra' da Justiça, a impunidade acabou. Como operador da Justiça não dou como dado adquirido a culpabilidade de qualquer suspeito, a contrario da citada. A prova é que nunca aqui zurzi qualquer consideração sobre a tal ONG que facilitava não sei o quê e a quem e a troco de 1000 contos por mês e de que ninguém se lembra. Daqui a uns anos talvez estejamos a falar da Tecnoforma.
A "crise política" que se anuncia relaciona-se obviamente com o descrédito das instituições e a dificuldade ora imposta a António Costa e a colagem que lhe irão fazer ao ex-governo e à figura de Sócrates. Antecipo toda uma campanha eleitoral da actual maioria nesse sentido no próximo ano.
Aliás, era mais do que previsível que surgisse uma qualquer investigação que envolvesse uma figura do PS e nada como o alvo predilecto José Sócrates. Depois do Caso Labirinto é no mínimo uma grande coincidência um processo a envolver o PS e no mesmo dia em que o PS elege António Costa. 
Outra curiosidade é a escolha do dia, parece que é à sexta-feira que a justiça portuguesa gosta de deter cidadãos mais ou menos influentes.
A detenção em si mesma, no próprio aeroporto, de um ex-primeiro Ministro e efectuada pela AT é também manifestamente exagerada e quando comparada com o procedimento desenvolvido quando o visado foi Ricardo Salgado. Não se enganem, ou há mesmo indícios e meios de prova fortíssimos, ou a Justiça cairá num descrédito total. Se os houver, se for acusado e considerado culpado, pois muito bem, que cumpra a pena.
Bem sei, que há neste momento muita gente feliz, sedentos de vingança e destilando todo o seu ódio visceral e partidário. A esses lembro-lhes o caso dos submarinos, a Tecnoforma, o Isaltino. Duarte Lima, Dias Loureiro, BPN, BES, vistos Gold e outros que tais. É a velha questão do telhado do vizinho e que nos deve fazer reflectir sobre a crise da política neoliberal em curso. Eu continuo triste, não apenas por este caso, mas por todos os outros que possam pôr em causa a democracia em Portugal.
E sobretudo continuo triste pela miséria a que este governo nos votou... E essa continua a ser a questão fundamental.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

O clube dourado insiste e resiste

Torna-se bastante difícil ao comum dos mortais conseguir enumerar o número de secretários de Estado ou de ministros deste governo que já se demitiram. Houve até um deles, o autor do clube dourado (leia-se vistos gold), cuja decisão de demissão era irrevogável, mas é dos poucos que ainda resiste. Desde Gaspar, passando por Relvas e pelo Álvaro até ao mais recente Miguel Macedo.
Há quem entenda que Macedo era dos mais competentes ministros deste governo, ou, reformulando, o único ministro competente deste governo, mas eu lembro-me bem das manifestações das polícias contra polícias e da reforma compulsiva e dourada do comandante da PSP.
Há quem diga que saiu com dignidade, eu digo que saiu acossado por uma rede de influências douradas.
No entanto, há todo um governo a cair de podre que persiste em gerir como administrador de insolvência um país retalhado, com pessoas que não contam para nada, a não ser para as estatísticas marteladas do desemprego. E nesse governo há dois ministros (da Justiça e da Educação), que insistem em fazer de conta que sabem o que estão a fazer. Como eu gostava que saíssem todos com dignidade. A dignidade que é o único que lhes resta, mas em doses cada vez menores...

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Da série: em 2020 é que é!

Compreendo bem a necessidade que o governo sente de atacar António Costa. Percebo bem a tentativa e a estratégia de o colar a Sócrates, aliás, a maioria não terá outra estratégia até às eleições. Só não percebo que na cidade onde se paga menos impostos do país e considerada a primeira onde se vive melhor, em todos os sectores, queiram transformar uma taxa de um euro num processo político de julgamento de futuras intenções.
António Costa já conseguiu a coisa extraordinária de fazer parecer que já é primeiro Ministro sem o ser, e a maioria já conseguiu a façanha de se comportar como verdadeira oposição... Mais um case study da política em Portugal. Uma verdadeira viragem...


P.S.- Parece que o governo cobra mais que o edil de Lisboa em taxas de dormidas e estadias na própria capital...


terça-feira, 11 de novembro de 2014

Porque existem muitos vírus...

E para ajudar ao meu cepticismo europeísta, vem o Juncker, novo presidente da comissão europeia, borrar de vez a pintura. Enquanto ministro das Finanças e primeiro Ministro do Luxemburgo, parece que terá negociado (secretamente) com algumas centenas de empresas multinacionais para que aliviassem a carga fiscal que teriam de pagar nos seus países, aproveitando-se da legislação generosa do Grão-Ducado.
Não se trata de evasão fiscal, trata-se de erosão da solidariedade entre estados membros. Trata-se da ética e da independência. Trata-se dos tais nacionalismos que farão implodir a UE há míngua de leis fiscais unificadas que pelos vistos ninguém quer. A integração ficou-se pela moeda que desaparecerá a breve trecho, deixando atrás de si um rasto bafiento de escudos que também ninguém quer, e com uma crise maior que a actual, se é que isso possa ser concebível. Mas a crise só chegará aos países periféricos. Os outros, enfim, os outros já sabemos quem são, os agiotas credores lucram sempre à custa da desgraça alheia... Começa bem Juncker...

P.S.- Parece que a PGR arquivou o processo contra os bodes expiatórios que a ministra da Justiça inventou. A seguir será a vez da legionella...

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Propaganda à Unicer por Pires de Lima

Falando a linguagem de Pires de Lima ontem na AR impõe-se a questão...

Óooo.... Piiireeess..., quaaaaantaaas.... cerveeejaaaas.... maaaamaaaasteeeee.... oooonteeeem,.... aaaanteees.... deeee.... iiiir..... paaaraaa..... aaaaaa..... AAAAseeeembleeeeiiiiiaaaa..... daaaa..... Reeeepúúúúbliiiiicaaaaa.....????

A triste figura aqui.


quinta-feira, 6 de novembro de 2014

A implosão da UE

Cameron quer recuar na livre circulação de pessoas na Europa. Merkel diz que é um "ponto de não retorno" para a saída do Reino Unido da UE e tem razão. Os recuos na integração vão continuar, como reacção dos poderes nacionais e resposta ao crescimento de movimentos nacionalistas e populistas contra o sistema. A falta de uma política comum solidária e uniforme de resposta à crise, de que o recém condecorado Durão Barroso é dos principais culpados, levará mais tarde ou mais cedo à implosão da UE. Basta ver a resposta dada à Rússia na recente crise ucraniana. Zero.
Na UE de hoje em dia, obedece quem deve, manda quem pode, e enquanto aqueles tentam sobreviver com as migalhas impostas pelos outros, os outros tentam capitalizar os medos internos enquanto engordam com os juros das políticas de austeridade alicerçadas em chavões falaciosos repetidos vezes sem conta. Assim se curvou Passos Coelho por cá.
Eu sei porque é que Merkel diz que Portugal tem licenciados a mais. Porque o tiro lhe fez ricochete no traseiro. A política de austeridade que impôs na UE levou à emigração de milhares de portugueses, e muitos deles para a Alemanha. O que Merkel está a dizer não é muito diferente do que disse Cameron. Estão os dois a dizer: "nós não queremos os vossos licenciados a tirar emprego aos nossos cidadãos". Além de ser um argumento que viola os princípios da UE, não corresponde à verdade. Se é verdade que em Portugal esta é a geração mais qualificada de sempre, também é verdade que o ratio de licenciados/população ainda é inferior à média da UE.
Mas os anseios e receios internos ditam outro tipo de respostas que não se coadunam com a integração europeia. Sou um europeísta federalista cada vez mais céptico.

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Eutanásia consciente

A propósito de Brittany Mynard, que escolheu morrer "com dignidade" no passado dia 1 de Novembro.
Eutanásia provém do grego 'euthanatos' e quer dizer 'boa morte'- 'eu' (boa) e 'thanatos' (morte). 
É um acto no sentido de provocar a morte a pedido de uma pessoa que sofra ou não de uma doença incurável.
A eutanásia pretende, desta forma, designar uma morte desejada voluntariamente por uma pessoa, executada activamente por outra pessoa.
Vários argumentos a favor e contra se perfilam, num assunto cada vez mais na ordem do dia. E como diz respeito à vida ou morte, mais controverso se torna. Dos argumentos a favor da eutanásia, os principais serão que viver é um direito e não uma obrigação, que é um caminho para evitar dor e sofrimento de pessoas sem qualidade de vida ou em fase terminal, com medo da solidão e de ser um estorvo, com falta de esperança e de expectativa e a morte com conforto.
Do lado dos contras temos os defensores dos cuidados paliativos centrando-se estes na existência e possibilidade de cuidados activos e globais, prestados aos doentes e às suas famílias por uma equipa multidisciplinar, quando a doença já não responde ao tratamento curativo e a expectativa de vida é relativamente curta, e que são doentes que não têm perspectiva de tratamento curativo, cuja doença progride rapidamente, que sofrem intensamente e que exigem apoio específico, organizado e interdisciplinar. Outros argumentos do lado do contra são sem dúvida a religião, a própria legislação, o desrespeito por códigos deontológicos, interesses consequentes da legalização e a relação médico/utente afectada negativamente.
A Bioética também constitui um forte argumento contra a eutanásia. Como estudo multidisciplinar das ciências da vida, actua sob princípios sólidos e busca orientar a prática científica. Regulamenta através da OMS os direitos e deveres do doente e tem-se debruçado negativamente contra a prática da eutanásia. 

"Eu juro, por Apolo (…) Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano ou mal a alguém. A ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda." Hipócrates

Na legislação portuguesa o direito à vida é o mais importante na Constituição, não sendo considerado um direito da pessoa sobre ela mesma. Não há um 'direito à morte'. Não há direito à eutanásia. A morte considera-se a partir do momento em que há morte cerebral, quando deixa de haver actividade no tronco cerebral e é um critério estritamente médico ( lei 141/99 de 18 de Agosto).
Existem várias formas de eutanásia, mas todas elas com uma base comum, que consiste numa intervenção médica, a um paciente em fase terminal. O auxílio médico, consiste em antecipar a morte, daí falar-se em homicídio ou não.
A eutanásia passiva diz respeito às situações em que o médico auxilia, omitindo as medidas adequadas para o paciente conservar ou prolongar a vida, o conhecido 'desligar da máquina', e que poderá ser nesta esteira uma nebulosa jurídica.
A eutanásia activa–indirecta acontece quando há uma intervenção médica para administrar medicamentos que vão encurtar a vida do paciente.
Por fim a eutanásia activa–directa é a intenção deliberada de terminar com a vida do paciente, ex: injecção letal.
Por já ter, infelizmente, vivido de perto, situações desesperantes de amigos e familiares, acho que a dignidade humana e o sentimento pessoal dos desesperados se devem impor à própria noção de vida que cada um tem e deseja para si. Com os limites bem definidos, a eutanásia devia ser possível para quem viva a morrer. 

“Quero morrer. Não sei mais que estou fazendo por aqui. Não vejo sentido em continuar uma existência em que sou apenas um mero observador dos acontecimentos e vidas que me cercam. Dou um grito de angústia expressando esse desejo de fechar os olhos. O que posso fazer para que as pessoas me compreendam?” 

Excerto do filme “Mar Adentro”