quarta-feira, 26 de março de 2014

A pobreza de espírito

Não há nada como uma pré-campanha eleitoral para se descobrir que afinal há pobreza em Portugal. De repente torna-se urgente dizer qualquer coisa aos excluídos e vítimas maiores da troika e da política de terra queimada. Agora já é necessário compensar e reduzir as desigualdades e as injustiças sociais que os últimos 3 anos agravaram. Mas só porque foram conhecidos esta semana os reais números da pobreza em Portugal.
Quando se passam dias a discutir as incoerências do discurso de Sócrates, ninguém é capaz de perguntar ao senhor primeiro Ministro porque é que tem que se empobrecer o país para depois combater a pobreza gerada por esse empobrecimento? E já agora seria também interessante que José Rodrigues dos Santos (que na próxima vez deve levar o arquivo completo) entrevistasse Passos Coelho acerca das suas incoerências antes de ser primeiro Ministro, no período de campanha eleitoral, em que o contexto temporal do que disse então é exactamente o mesmo de agora. Ao contrário do entrevistado de domingo. Perguntar-lhe também se não sabia quais eram as consequências da sua política económica e social baseada na austeridade, que por sua vez significou a ausência dessas mesmas políticas. É interessante contudo notar que Passos Coelho afirmou isso mesmo. Que era necessário empobrecer o país e as pessoas, com uma competitividade baseada numa política de baixos salários e dos custos do trabalho, no fundo transformar o país no Bangladesh da Europa sem nunca abdicar dos juros e da dívida impagável já reconhecido por todos de boa-fé.
Descobrir agora que existe um Estado Social nascido das cinzas da 2ª Guerra Mundial e que pôs a Europa na senda do desenvolvimento e da paz durante mais de 50 anos não é sério, quando se tenta destruí-lo em nome de um discurso estritamente ideológico e, esse sim, radical. O Estado Social que não serve para proteger bancos mas sim para proteger pessoas. Que garante igualdade de acesso de todos à saúde, à educação e de oportunidades por consequência. Que promove o bem estar assinado no contrato social com todos. E que tem como consequência e objectivo final o progresso individual que em união com todos os outros significa o progresso societário e colectivo de uma nação.
Passos sacrificou tudo em nome da austeridade e dos mercados, da Alemanha e do bom aluno, e quando se der conta destruiu um país sem pessoas, sem garantias, sem crescimento, sem economia e sem esperança.

P.S.- É curioso que os números continuem a cismar em não dar razão ao governo e à troika. Os dados da execução orçamental de Janeiro e Fevereiro apresentam um défice de 30 milhões de euros. É o crescimento, estúpido!

sexta-feira, 21 de março de 2014

Telegramas

1- Jorge Jesus não aprendeu nada com o final da época transacta. A sua verborreia, aliada à sua falta de cultura, que por sua vez se alia à sua arrogância, fazem-no muitas vezes engolir sapos e quase sempre desprestigiam a instituição para a qual trabalha. Um treinador que bate em polícias, nos adjuntos e directores, que não respeita colegas, e principalmente que não sabe ganhar, quando saber ganhar é para mim mais importante que saber perder.
Um homem que não humilha o adversário derrotado, que respeita o sofrimento de quem não alcança os seus objectivos é verdadeiramente sábio.
O 'mestre da táctica', 'da nota artística', 'acradita' que só desrespeitando e humilhando os outros pode ser grande. Como está enganado. Pena é que não o obriguem a pedir desculpas públicas ao Shéu e ao Rui Costa, a toda a equipa técnica, e ao Sherwood, e principalmente aos benfiquistas. E não é preciso ajoelhar-se...

2- Torna-se urgente uma lei que impeça os deputados da maioria que chumbaram a co-adopção, apenas alguns meses após a terem aprovado, de poderem adoptar qualquer criança, uma vez que não têm maturidade nem coerência intelectual para poderem exercer responsabilidades parentais.

3- Finalmente fez-se justiça. A culpa de terem prescrito ou estarem em vias de prescrever multas e coimas no valor de vários milhões de euros nos processos movidos contra Jardim Gonçalves e João Rendeiro desta vez não foi atribuída a manobras dilatórias usadas pelos advogados...

4- A crise na Ucrânia pode ser uma boa oportunidade para aproveitar e aumentar os vistos-gold a oligarcas russos. Já temos chineses e angolanos. Reatamos com os venezuelanos. Aceitamos os da Guiné Equatorial e portanto só faltam mesmo os russos para completar o ramalhete das nações mais democráticas do mundo que podem vir ao nosso país ensinar como se faz...

sexta-feira, 14 de março de 2014

É melhor estarem caladinhos

A dívida portuguesa é impagável nos próximos anos tal e qual como está previsto nos moldes actuais. O manifesto pela reestruturação da dívida assinado por 74 personalidades de amplos sectores e diversos campos da área política, entre eles dois ex-ministros das Finanças (Ferreira Leite e Bagão Félix) e até dois, (agora ex), consultores de Cavaco, propõe um caminho diferente. Apesar de não ser a solução, inicia uma base para atingir essa solução. Aponta sobretudo a falta de uma verdadeira reforma do Estado como o maior problema que o país enfrenta e a reestruturação da dívida proposta pelo devedor como forma de a tornar sustentável e pagável. A reforma do Estado está por fazer. Os cortes salariais e nas pensões, o aumento de impostos e facilitação dos despedimentos tornando-os mais baratos, ainda que os ilegais, não são de forma nenhuma a reforma do Estado que se impunha. O último exemplo surgiu a semana passada com os protestos das polícias. Abstendo-me agora de comentar a manifestação junto da AR, a verdade é que também nesse sector nada foi feito para reformar o sistema de segurança e da administração interna. O que se verifica nesse como noutros sectores são os cortes cegos. Como na saúde onde um acidentado em Chaves só é atendido em Lisboa. Como na justiça, em que as populações têm que fazer centenas de quilómetros para aceder aos tribunais em vias de encerrar ou de perder competências (debate que ainda não vi em nenhum lado). O país está melhor, dizem, mas as pessoas estão pior. Exacto. Um país sem pessoas seria bem mais fácil de gerir.
Mas o que fica mesmo do manifesto foram as reacções. Desde acusações de radicalismo e eleitoralismo, até às propostas da lei da rolha, vindas dos muito na moda jornalistas/comentadores/escritores/economistas, donos da razão e arautos da verdade, mas só da deles. Os outros é melhor estarem caladinhos. Não se pode desagradar à troika e aos mercados. É melhor comer e calar. Pensar de forma diferente, apontar outras soluções deve ser calado e contrariado sem debate. A forma mais séria, honesta e democrática dos dias que correm. Uma proposta desta natureza que contraria o pensamento dominante da inevitabilidade que nos venderam até aqui não pode sequer ser expressa. Era só o que faltava haver gente a pensar de forma diferente do governo e dos seus cães de fila. Onde é que isso já se viu...
Curioso é notar, todavia, que o que o manifesto defende não é em nada diferente do que Cavaco escreveu no mais recente prefácio aos seus 'Roteiros'. Cavaco é sem querer o subscritor setenta e cinco do manifesto. Anda para aí muita gente distraída.

O que diz o manifesto:

"Nenhuma estratégia de combate à crise poderá ter êxito se não conciliar a resposta à questão da dívida com a efectivação de um robusto processo de crescimento económico e de emprego num quadro de coesão e efectiva solidariedade nacional."
"A dívida pública tornar-se-á insustentável na ausência de crescimento duradouro significativo: seriam necessários saldos orçamentais primários verdadeiramente excepcionais (...)."

O que diz Cavaco:

"A situação portuguesa melhorará se a União Europeia for mais ativa e eficiente na promoção do crescimento económico e na criação de emprego."
"Será decisivo para que, no período "pós-troika", se possa conciliar o respeito pelas regras europeias de equilíbrio orçamental e a redução do desemprego, o crescimento dos salários e das pensões, a melhoria da qualidade dos serviços públicos, como a educação e a saúde, e a resposta que ao Estado cabe dar no combate à pobreza e à exclusão social."
"É essencial proceder à correção de injustiças acumuladas no período de execução do programa de ajustamento."
"Pressupondo um crescimento anual do produto nominal de 4% e uma taxa de juro implícita da dívida pública de 4%, para atingir, em 2035, o valor de referência de 60% para o rácio da dívida, seria necessário que o Orçamento registasse, em média, um excedente primário anual de cerca de 3% do PIB. Em 2014, prevê-se que o excedente primário atinja 0,3% do PIB."

sexta-feira, 7 de março de 2014

O matarroano

O matarroano é um espécime em vias de extinção. É originário de Portugal com maior predominância no interior do país. Fala 'futebolês' na perfeição e caracteriza-se fundamentalmente pela forma como se desloca a caminhar. Os braços e as pernas afastados do corpo num ângulo de 90º dão a sensação de estar a marchar ao mesmo tempo que se prepara para uma luta de sumo japonesa. O bigode farfalhudo é característica típica apesar de ter caído em algum desuso. A barriga proeminente de mulher grávida em última semana de gestação é outra característica tipificadora desta classe de paquiderme. O seu tipo de locomoção é muito influenciado por esta última característica. É também muito comum encontrarmos nesta espécie o uso de um palito no canto da boca, camisola interior cavada e quase sempre manchada. O pêlo abundante nos ombros, no peito e nas costas dão-lhe um ar brilhante na época do calor devido às gotículas acumuladas de suor nas suas pontas. É frequente encontrarmos matarroanos que usem uma volta de ouro ao pescoço, principalmente se o individuo em causa estiver deslocado noutro país. Na época mais fria essa volta em ouro é usada por cima da camisa aos quadrados grandes e garridos e na época de mais calor, se não estiver a usar a camisola interior cavada, é usada com uma camisa desabotoada até ao umbigo. Expressa-se com monossílabos e palavrões em tom grave que facilmente é identificável a 3 km de distância e tem sempre um ar ameaçador. A sua alimentação é baseada em tudo o que puder ingerir permanecendo várias horas seguidas nesse processo.
A subespécie que vive no litoral tem um peso corporal substancialmente menor mas as principais características mantêm-se. Desenvolveu no entanto alguma capacidade de se expressar, conseguindo juntar até 3 frases seguidas com algum sentido, mas ainda assim de difícil compreensão. Têm em comum ser do Benfica e imitam frequentemente a opinião dominante que o Porto está em fim de ciclo. O matarroano é também muito religioso: apelida o presidente do principal rival de 'papa', o seu estádio de 'catedral', o seu jornal de 'bíblia' e tem fé no Jesus.

P.S.- O Benfica também tem adeptos que não são matarroanos.

quinta-feira, 6 de março de 2014

E tu Pedro? Já pegaste numa enxada?


Durante o debate quinzenal na AR no dia de ontem, Passos Coelho deu mais uma machadada na democracia parlamentar do país. Ao recusar responder a uma deputada, Catarina Martins, que, tem o dever e o direito de fiscalizar a acção política do governo, Passos Coelho tirou finalmente a máscara. Ou caiu-lhe. Este senhor, que foi eleito democraticamente, já não tem legitimidade moral e ética nem cultura parlamentar para continuar a gerir os destinos do país, enquanto temos país. Aliás, esta maioria, que governa contra a lei e a constituição, que defende o empobrecimento e mente ao país, como ainda ontem se viu com espanto (ou talvez não) a afirmação que afinal os cortes em salários, pensões e reformas são definitivos quando sempre juraram que eram temporários. Uma maioria que não tem respeito por ninguém e que esconde que a sua intenção é viver num Portugal sem portugueses. Que descobriu o consenso quando afirmara uns meses antes que não precisaria do PS e da oposição para nada no período pós-troika. Esta é a verdadeira cara deste primeiro ministro, deste governo e desta maioria. Uma cara com odor ao bafio salazarista. Vejo com azedume a presença deste primeiro ministro nas comemorações dos 40 anos do 25 de Abril. Este senhor não faz lá nada e Abril nada lhe diz.
Recomendo a visualização do vídeo acima para prova do alegado. Aviso porém que contém material potencialmente corrosivo para pessoas mais impressionáveis...