quinta-feira, 28 de março de 2013

As perguntas que se impõem

Silva Carvalho foi reintegrado nos serviços do Estado por imposição legal. A lei orgânica dos serviços de informações permite aos elementos do SIED, SIRP ou SIS com seis anos de serviço ininterrupto terem automaticamente vínculo definitivo ao Estado e o direito à integração na Secretaria Geral da Presidência do Conselho de Ministros. A diferença é que o ex-espião só não tinha, ao que se julga saber, licença para matar. Porque de resto, desde abuso de poder, passando por violação de segredo de Estado, até acesso indevido a dados pessoais, o homem está acusado de tudo. Impõe-se a pergunta: Passos e Gaspar tinham que o reintegrar no staff da Presidência do Conselho de ministros já? Tanto se fala em períodos de nojo e falta de vergonha na cara e isso só se aplica ao José regressado de Paris?
Alguns médicos receberam horas extraordinárias relativamente ao período normal de trabalho e operaram utentes do privado nos hospitais públicos. Impõe-se a pergunta: de quem é a culpa? Dos médicos prevaricadores ou dos Conselhos de Administração que lhe amparam o jogo? Sendo que alguns médicos receberam mais de €200 mil anuais... Eventualmente o problema do SNS é um problema de gestão e gestores e não tanto do que é mal gasto em pensos e bisturis... E se calhar também dos subsistemas de saúde com claro destaque para a ADSE. Mas isso já é outra conversa. Com a Ordem dos Médicos não é conveniente levantar muitas ondas, não é?
O PSD chumbou a proposta do CDS para a audição na AR do chefe de redacção da RTP. Por causa de Sócrates obviamente. Impõe-se a pergunta: a coligação aguenta?
O Estado pagou a António Borges mais de €300 mil no ano passado. Impõe-se a pergunta: porquê? Para assessorar a venda do país a retalho e em saldo? Para o 'ministro das privatizações' poder dizer que os salários em Portugal são demasiado altos?
Passos Coelho disse que a decisão do TC deve ser responsável. Impõe-se a pergunta: ao invés de pressionar um Tribunal, órgão de soberania da nação, não deveria perguntar-se onde está a sua responsabilidade? Porque não se absteve previamente de violar a CRP? Porque é que o Orçamento poderá ser inconstitucional? Porquê é que o Orçamento trinta dias após entrar em vigor já era inaplicável por incompetência e erro grosseiro nas previsões e nas contas?
O chefe da missão do FMI para Portugal, Abebe Selassié, numa entrevista à Lusa, admitiu o falhanço total das previsões e das expectativas tanto da troika como do governo. No desemprego, no défice, na dívida pública, nas rendas e nos preços da energia, na recessão, no consumo, etc, etc, etc. Não estará na altura de mudar de estratégia e de políticas? 
E o que se discute em Portugal é o regresso de Sócrates como comentador?

terça-feira, 26 de março de 2013

Norte e Sul

A guerra da secessão norte americana teve na sua génese a escravatura e o racismo que os estados do sul defendiam e os do norte queriam abolir. Ganhou o norte para bem da humanidade.
As duas guerras mundiais do século XX tiveram como protagonista a Alemanha imperialista e xenófoba. Perdeu das duas vezes para bem da humanidade.
Em pleno século XXI assiste-se à guerra financeira no seio de uma UE que devia ser solidária e igual entre estados. A UE não é um Estado federado, e portanto, apesar de haver uma moeda única, não se põe em questão uma secessão. Não existe o perigo de declarações unilaterais de independência porque os estados são independentes, fora os que tiveram ou têm intervenção da troika.
A Alemanha entrou para a UE sob pressão da França, de modo a conseguir controlar o seu poderio económico e militar. Com receio do que lhe tinha acontecido anos antes. Chipre entrou na UE sob chantagem da Grécia.
Num caso e noutro, a França e a Grécia acabaram por sucumbir a um maior poderio da economia alemã e aos seus próprios erros, que a Alemanha jurou nunca mais cometer.
Sem ter medo das palavras, o imperialismo alemão é de novo uma realidade. Desta vez por uma via menos bélica. A diferença entre o norte e o sul da europa acentua-se à medida que a crise se desenvolve. A Alemanha que controla o BCE, define a intervenção nos países periféricos, mais pequenos e mais expostos. Repare-se como, apesar de urgente, em Espanha e Itália não houve resgate como em Portugal e na Irlanda. Mas a austeridade fez-se sentir quase nos mesmos moldes.
A última novidade é o assalto a Chipre. Duas notas prévias. O Chipre é um paraíso fiscal de lavagem de dinheiro, sobretudo russo. Chipre tem das maiores reservas naturais de gás natural. Os depósitos bancários do Chipre representam quase 900% do seu PIB. Chipre comprou massivamente dívida pública grega. A banca deu o estouro, e naqueles termos, obviamente o país. Qual a solução encontrada para impedir o domínio russo sobre o país e consequentemente sobre o seu gás natural? O confisco das contas bancárias. O que se segue? A fuga de capitais que a Alemanha e a Holanda já se ofereceram para receber. Percebem?
O Eurogrupo, ordenou este assalto a Chipre com o beneplácito de Gaspar, que por ser ministro das Finanças dele faz parte. Votou a favor. Dijsselbloem, o holandês presidente do Eurogrupo disse no domingo que a forma de resgate a Chipre é uma nova forma de resolver os problemas na banca da zona euro. O ministro das Finanças alemão Schauble, disse ontem que os críticos do sul têm inveja da Alemanha.
Norte e Sul, duas europas, e a UE que já não é união nenhuma. A Alemanha paga muito. É verdade. Mas lucra bem mais... Não se iludam. Este assalto às contas bancárias é uma nova forma de comprar um país que só representa 0,2% do PIB da UE. O norte da Europa, impediu a Rússia de controlar o Chipre, comprando-o. E prepara-se agora para enriquecer a sua banca, com a inevitável fuga de capitais do Chipre. O confisco dos depósitos é o maior assalto da história. Um assalto sem precedentes e perigoso. Os líderes europeus ainda não perceberam que as suas acções e sobretudo omissões, serão o fim da UE e o dos ideais que a construíram. Agora juntaram a desconfiança à desesperança.
Acrescente-se ainda que o único órgão que é eleito pelos cidadãos europeus, o Parlamento Europeu, não tem qualquer poder nem voz activa no processo e a Comissão Europeia é subserviente aos desígnios alemães. Quem manda na Europa é o Eurogrupo, e o BCE e quem manda nestes é Merkel. A UE tem falta de democraticidade. É uma amálgama de órgãos inúteis, a que se sobrepõe o diktat alemão.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Regresso sem nevoeiro

Toda a gente tem direito à sua opinião. Mas eu também tenho direito a dizer que uma opinião é estúpida, estapafúrdia, ignóbil e idiota. Assim como as minhas podem ser apelidadas disso tudo. É a vida salutar em democracia.
A petição contra a contratação pela RTP como comentador de José Sócrates é tudo isso. Estúpida, estapafúrdia, ignóbil e idiota. Com direito talvez, a ser discutida em plenário da AR. Ora aí está, uma petição capaz de nos salvar da crise, orientar-nos no caminho do crescimento e do progresso.
Sinceramente não compreendo tanta histeria. Não querem ver, não vejam. Ainda não vi nenhuma petição contra os Ulrichs, os Medinas, os Soares dos Santos, os Belmiros, os Santanas, os Durões que fogem do país para servir de capacho a Merkel, os Marques Mendes, os Borges, os Felix, os Relvas deste mundo... Porque é que todos os outros podem e o José não pode?
A memória é curta e já ninguém se lembra que a Troika foi chamada ao país porque o pior primeiro Ministro da história de Portugal, Passos Coelho, queria chegar ao pote depressa. Porque chumbou o PEC IV já aprovado pela UE, considerando que era demasiado austero. E quando digo austero, falo na austeridade que toda a gente trata por tu.
Assim de repente, sou capaz de me lembrar de várias possibilidades para uma petição pública com pouca dignidade, mas suficiente para ser discutida pelos nossos 'pobres' deputados. Desde o pedido de recusa de Relvas abrir a boca, muito menos para cantar, até ao pedido de regresso de Durão Barroso para ser julgado por traição à pátria, incluindo o pedido a favor da tomada no cu de Gaspar...
Ainda assim estou curiosíssimo e ansioso pelo primeiro programa em que Sócrates seja interveniente.
O PSD teve os piores primeiro Ministros da democracia portuguesa, desde Cavaco, passando por Durão e Santana Lopes e acabando em Passos Coelho. Sócrates foi-lhes superior em tudo. É uma opinião... Gostava, ou não, de os ter visto a braços com a maior crise económica e financeira de sempre. Fariam melhor? O resultado do governo de Passos está à vista. Mais troikista que a troika. Não confundir com mais trotskysta que Trótsky.
Os signatários da petição contra o programa de comentário político de Sócrates na RTP são os mesmos que acham normal que a AR faça recomendações ao governo com vista ao regresso de um programa tipo TV Rural?
Quem não preza a liberdade de imprensa e de opinião e a independência editorial da comunicação social, em geral, e da televisão pública, em particular, só merece ter Miguel Relvas como ministro, o mesmo das pseudo, supostas, alegadas pressões a uma jornalista do Público, e o mesmo cujo CV é de rir se comparado com o de Sócrates. Ou será que foi Relvas que se lembrou de recomendar à RTP o regresso de Sócrates? Pena é que não exista também uma petição a favor de mandar Relvas estudar, ainda que em Paris. Também não me lembro de nenhuma petição a favor de calar a Manuela Moura Guedes naquele programa 'travestido' da TVI. E se a houvesse também não concordaria com ela. E que grande boca ela tinha. A lei da rolha não existe ou ainda não existe em democracia. E como me custa ouvir Cavaco no pouco que agora diz, ou Relvas a assassinar a Grândola!
De todo em todo, ainda assim, acho prematuro o regresso de Sócrates ao comentário político. Porque vai ser aproveitado por este (des)governo e por todos os desgovernados contentinhos. Porque pode ser um balão de oxigénio para esta maioria e uma pressão indesejada sobre a já pressionada oposição. Será essa a intenção? Porque Sócrates também tem culpas no cartório. Porque o seu maior pecado é a vaidade. É inegável que uma significativa franja de  portugueses ainda pensa que é o maior vilão da história da democracia. De todo o modo a RTP já garantiu audiências que até aqui provavelmente nunca teve nem teria...



quarta-feira, 20 de março de 2013

Os dinossauros também se abatem

Já o tinha escrito aqui, podem ver o resultado aqui, com direito a sentença e tudo. Seara não se pode candidatar à Câmara Municipal de Lisboa. O chico-espertismo sofreu hoje um duro golpe. Apesar de Fernando Seara já ter anunciado que vai recorrer da sentença, a verdade é que a sua candidatura está em sério risco. As listas têm que ser entregues até meados de Agosto. E já se sabe que a justiça tem um timing muito seu. Mesmo no caso da possibilidade da inconstitucionalidade do orçamento para 2013, em tempos de emergência nacional, nem assim o TC decidiu. Tinha três meses para o fazer e esse prazo esgota-se para a semana. Antevê-se muito difícil uma decisão em tempo útil para Seara e eventualmente para os outros, com Menezes à cabeça. Em política ainda não vale tudo, e os dinossauros também se extinguem como os antepassados. Deixar para os tribunais o que é da política e que esta devia ter resolvido só pode dar mau resultado. A culpa é da maioria e dos seus jogos de estratégia, com a ajuda até do insuspeito Presidente da República. Os fins não justificam os meios. Tentar encontrar dúvidas na lei onde não as há, deitando areia para os olhos de todos, para atingir os seus fins eleitoralistas dá e dará derrotas em todos os campos. Da justiça às eleições.


Ainda assim, depois já ter lido a sentença na íntegra, afigura-se-me aconselhável ler os seus fundamentos. Está lá tudo. Desde a polémica com o 'de' e o 'da', até toda uma construção jurídica de análise constitucional.

domingo, 17 de março de 2013

Portugal foi à bruxa e saiu-lhes o Gaspar!

Vítor Gaspar fez mais uma consulta ao país. A consulta de cartomância e bruxaria do costume. Previu o futuro, outra vez, e mais uma vez sabemos que vamos ser enganados. A bola de cristal de Gaspar definitivamente não funciona. É um embuste. Como qualquer bruxo que se preze do nome, faz previsões e não acerta uma, a não ser por mera coincidência. E Portugal não pode ser governado com base em hipóteses enigmáticas e aposta na coincidência. Até porque já toda a gente percebeu, excepto o nosso ministro das Finanças que não são coincidências. Aumento dos impostos, cortes nas pensões e reformas, quebra no consumo, redução de investimento, aumento do desemprego, menos receita fiscal, recessão, desemprego, a espiral recessiva que já se conhece e para a qual há vários meses vem sendo alertado. No tom hipnotizante habitual acabou a conferência de imprensa a responder aos jornalistas com um enigmático, preocupante e indiferente: "Não sei...".
A sétima avaliação da troika pôs a nu toda a incompetência de Gaspar e do governo. Estes por sua vez puseram a descoberto toda a ignorância que a troika demonstra sobre a economia de Portugal.
O corte de €4000 milhões na despesa do Estado (apresentados falaciosamente como refundação do Estado) revelou-se impossível de alcançar num ano. Não será fácil nos dois que se seguem. Os ministros conseguem aumentar impostos do pé para a mão. Basta não olhar a pessoas e vê-las como números. Olhar para 300 mil pequenas e médias empresas que necessitam do acesso ao crédito para sobreviver e pôr isso nas mãos da banca descapitalizada por culpa própria, com jogos de casino e bónus pouco éticos. Qualquer leigo sabe que isso representa a insolvência do tecido empresarial português e o aumento brutal do desemprego. Para além da incapacidade de cortar na verdadeira despesa do Estado. Recorrendo a truques de tesouraria e à custa da venda em leilão dos sectores fundamentais de regulação estadual. Abdicando de empresas estratégicas de interesse nacional como é o caso da EDP que apresentou lucros de €1000 milhões, e de que ainda vamos ser chamados a pagar o défice tarifário. Pasmem-se!
O défice de 3%, que é a meta a atingir do memorando, passou de 2013 para 2015. A troika abonou mais dois anos. Gaspar não queria nenhum. A sua humanidade e humildade inexistentes roçam o ultraje. Este memorando já não é o assinado em 2011. Esse memorando já sofreu ajustes que o põem no patamar que Passos Coelho sempre idealizou. O desemprego como dano colateral para baixar salários e custos com o trabalho, despedimentos e indemnizações. A recessão como inevitabilidade com os fins únicos da desalavancagem da banca e redução rápida dos desequilíbrios externos. Um dos objectivos do memorando ideológico está quase cumprido, a redução drástica dos custos do trabalho. Mesmo que seja à custa de milhares de desempregados, pensionistas e reformados. E isto ainda não acabou. O processo de intenções da conferência de imprensa de sexta-feira de Gaspar é a curto prazo preparar-nos para mais cortes. Mas não os €4000 milhões anunciados. São mais cortes do mesmo. Pensões, reformas e salários. Afinal é só o que o governo sabe fazer. Fá-lo como ninguém em abono da verdade. E se o TC declarar a inconstitucionalidade dos três artigos em causa do Orçamento para 2013, que já por si e por mérito de Gaspar é inaplicável, então, só resta um caminho ao governo, a demissão e a saída pela porta dos fundos.
Não é desejável uma crise política, no entanto, dando como certo que Portugal necessita de um ajustamento, sério, justo e capaz, e precisa de cortar nas famosas gorduras do Estado, após dois anos deste desgoverno, já não é tão certo, neste momento, se isso não será o melhor para o país. Ou não sabem que mesmo depois deste esforço a dívida pública portuguesa atingirá 124% do PIB em 2014? Ou que a consolidação orçamental é um descalabro? Ou que em 2014 o desemprego atingirá mais de um milhão de portugueses? Ou que este governo é tão incompetente que nem a sua matriz ideológica consegue cumprir? Que a sua matriz liberal já não é sequer um programa mas antes uma questão de sobrevivência quotidiana sem qualquer ideia para o futuro? Que queria tirar do Estado e dar aos privados, cortando e vingando-se do Estado social e que nem isso consegue fazer porque não sabe como?
Portugal foi à bruxa e saiu-lhes o Gaspar!

quarta-feira, 13 de março de 2013

O primeiro Conclave do resto da sua vida

Ontem começou o conclave e houve fumo negro no Vaticano. Mas o fumo que vem do arder da fogueira católica já é negro há muito tempo no Vaticano. Escândalos financeiros, abusos sexuais, pedofilia, corrupção e jogos de poder dentro da Cúria Romana e da estrutura do clero têm marcado os últimos anos da igreja católica. A abdicação de Bento XVI, 600 anos após a última, e a sua invocada falta de forças, significaram um gesto de enorme alerta para os católicos. Um relatório encomendado pelo Papa emérito terá estado na origem de tal acto. Os lóbis de influências, as ocultações criminais dos pecados sexuais de homens da igreja, os jogos de poder, o Vatileaks e o escândalo financeiro do Banco do Vaticano foram fortes demais para que Bento XVI os pudesse enfrentar. A Cúria está doente e a igreja atrasada e estagnada, sem conseguir responder aos desafios da sociedade de informação do século XXI.
1200 milhões de católicos espalhados por todo o mundo esperam agora por um Papa revolucionário, com a honestidade intelectual suficiente para conseguir dar resposta a um número incomensurável de devotos que anseiam por uma igreja moderna e virada para o futuro.
As patranhas que nos apresentaram como Verdades Universais, ano após ano, já não encontram eco na sociedade liberal, informada e globalizada de hoje. O espaço eucaristial e religioso tem que apresentar soluções mais terrenas e factuais, para não dizer históricas, para que a fé seja processada numa perspectiva mais mundana, em que toda a gente que queira, consiga perceber que a igreja católica não é apenas um auto ou acto de fé. É feita de homens para os homens e desde que estes assim queiram. O Espírito Santo e o livre arbítrio já foram chão que deu uvas. Já não explicam tudo e já não explicam nada. A religião acomodou-se e as pessoas ficaram mais exigentes.
Respeito quem assuma a sua fé. Não respeito que as mesmas pessoas não façam da escandalosa vida da Cúria uma luta de exigência como o fazem com os políticos e com os partidos. Aliás é disso que se trata, a vida clerical dos cardeais iluminados é hoje um jogo de bastidores político e de partido, ainda que seja o lóbi gay. Está lá tudo, o tráfico de influências, os jogos de poder, a banca do Vaticano! e o tráfico de armas, o Estado do Vaticano e os abafados abusos sexuais. A honestidade moral e ética da vida civil e em sociedade é, ou deveria ser, a mesma da Cúria. A diferença está na forma como alguns olham de baixo para cima.
A igreja católica ou se moderniza, ou aparecerá nos livros de história como um dos maiores logros da humanidade.
Sou católico por baptismo e ateu confesso, mas olho com preocupação para uma igreja que ainda influencia o pensamento e a acção de milhões de pessoas. É como tudo, desde o berço, o exemplo vem de cima.
A Capela Sistina merece muito melhor...

segunda-feira, 11 de março de 2013

Prefácios do Presidente

Já se sabe que o cargo de Presidente da República é meramente representativo. É vazio de poder. Tem no poder da palavra o seu mais forte carácter intervencionista. Todos nos lembramos da intervenção de Cavaco Silva há um ano num dos seus famosos prefácios dos 'Roteiros' em que pura e simplesmente desancou Sócrates de fio a pavio. E o seu discurso de há dois anos na AR em que disse ser necessário um sobressalto cívico porque o povo já não aguentava tanta austeridade. Pelos vistos agora aguenta. Ai aguenta, aguenta.
Cavaco é um taticista. Protege-se como ninguém, não se compromete com nada, limita-se a estar em vez de ser, e na altura em que mais se sente falta de alguém que tenha o poder da palavra e que a use em favor do povo que nele votou directamente, o nosso PR, remete-se ao silêncio. Escreve umas coisas no facebook, e uns prefácios de vez em quando. Assegura, com lamento, que trabalha 10 horas por dia, que a sua reforma não lhe chega para as despesas, e o povo, coitado, tem pena dele. Aceitou ser Presidente com todo o sofrimento que isso lhe causa. É um homem amargurado e sacrificado. O queixume presidencial é o medo e a impotência de quem não quer fazer e cuja única preocupação é a salvação do governo.
Cavaco não é político, nem economista, afinal é um pobre reformado, explorado pelo Estado.
Quando chove, Cavaco passa entre os pingos da chuva. E nem uma palavra para os reformados e pensionistas. Afinal as desproporcionalidades inconstitucionais foram levantadas por ele. Nem uma palavra para os desempregados. Nada. A nulidade. O niilismo do cargo. Apenas o ego e o orgulho de um Presidente que não preside a coisa nenhuma e que tenta sempre, isso sempre, assegurar a coesão e a estabilidade da coligação de governo. Como ele, salvador da pátria, fez questão de explicar. Nos bastidores, Cavaco gere um país de silêncios. Os silêncios de quem não tem voz e a quem Cavaco devia emprestar a sua. Mas recusa por uma questão de gestão da sua figura pública, que se esconde nos bastidores. Cavaco não serve o interesse dos portugueses... serve os seus.

sexta-feira, 8 de março de 2013

Hoje não dou flores à minha mulher

Hoje não dou flores à minha mulher. Dou-lhe o beijo de todos os dias. Hoje não dou uma boneca à minha filha. Encho-a com os beijos de todos os dias.
A mulher é como um gato. Felina e macia. Independente. Pode ser o êxtase e a loucura. E só uma mulher tem o poder de nos levar à loucura. As mulheres não exigem, ganham sempre. Sem contemplações, nem arrependimentos. Os homens quando exigem, ganham um frete  (dependendo do humor), mas perdem a mulher. Uma mulher que não é lembrada todos os dias não pertence a nenhum homem. Ter o amor de uma mulher é a realização suprema e a afirmação derradeira de qualquer homem. Da mãe, da mulher ou da filha. Em minha casa manda uma mulher, e só tem 14 meses de idade.
O dia de hoje representa a memória de todas as mulheres que lutaram e lutam para uma maior igualdade de género. Nada mais que isso e tudo o que isso representa. E só por isso merecem o seu dia. A mulher deve ser celebrada todos os dias. Se é verdade que ainda não foi atingida a plenitude dessa igualdade, e que em muitos países, nomeadamente os árabes onde tal nem sequer se concebe, também é verdade que o dia por si só nada mais traz de decisivo. Essa luta, que admito, ainda não está completa, quer ao nível das grandes decisões e também no nível salarial, não se resume a um dia. Aliás, o dia em si, é quase discriminatório. Vale, repito, pela memória das mulheres que lutaram para que hoje se possa afirmar que a mulher é, de pleno direito, igual ao homem. Não pode nem deve ser de outra maneira. Perdoem-me as mais feministas, que vejo como o oposto do machismo, próprios de quem quer ser mas não sabe. De quem precisa da afirmação frustrada de possuir um cérebro. Fundamental é a justa divisão de tarefas, e crucial o consenso gerador de respeito pela individualidade de cada um.
Uma última nota para a Lei da Paridade. Esta não nasceu a 8 de Março, nem por causa dele. Haverá de facto ou haveria de facto discriminação no acesso a lugares políticos? As feministas responderiam afirmativamente. Mas não me parece que assim seja, até porque ao observar atentamente os exemplos femininos que temos tido na esfera da política nacional e não só, muitas delas com posições de destaque e de liderança nas listas partidárias, não sinto que haja falta de oportunidades e abertura dos partidos às mulheres, desde que estas manifestem motivação.
Se considerarmos que a mulher é de facto discriminada no acesso à representação político-partidária, o que não me parece, então deveríamos implementar uma paridade efectiva e não o método das quotas, não se reduzindo a Lei a uma questão de sexo. Até porque, pode-se atingir uma solução perniciosa, e que consiste na atribuição de lugares só porque sim, independentemente do mérito ou motivação.
A todas as mulheres sem excepção...

quarta-feira, 6 de março de 2013

Morreu um ditador

Morreu Hugo Chávez. Morreu um ditador. Apesar de nutrir alguma simpatia pelo homem que sempre disse de Bush Jr. o que ninguém tinha coragem para dizer, a verdade é que deixou o seu país na pobreza, mesmo nacionalizando a maioria dos factores de produção, com especial destaque para o petróleo. A sua veia pouco democrática de poder absoluto, de controlo do Estado e de plebiscitos duvidosos é um factor que não pode nem deve ser ignorado. Morreu um ditador. Que usou a propaganda e o populismo como todos os ditadores o fizeram no passado. Aproveitando as crises, económica e financeira, do capitalismo (de mercado e liberal) e dos valores da democracia.
Assim sucedeu, como a história nos faz questão sempre de lembrar, há quase um século. Na Alemanha, na Itália e em Portugal. Em Espanha e na América Latina. Na África e na Ásia. Na URSS.
Na ressaca da I Grande Guerra, o desemprego e a pobreza eram os principais problemas da Europa. Na Alemanha o desemprego atinge os 33% nos princípios dos anos 30. As reparações de guerra e o tratado de paz de Versalhes com perda de território e de população é visto como uma humilhação. As convulsões antidemocráticas e contra a I República de Weimar fazem proliferar os grupos paramilitares e extremistas, entre eles o nazi da Baviera. A onda antidemocrática e antirrepublicana varre o país. A desvalorização do marco e a hiperinflação transformam burgueses em mendigos e especuladores em milionários. A austeridade esmagava o povo e protegia as classes mais abastadas. Entretanto dá-se o crash da Bolsa de Nova Iorque em 1929, o crédito fechou as torneiras e a recessão agrava o que já era grave. Um jovem aproveita a onda e munido de propaganda e populismo promete fazer da Alemanha um império (Reich). Esse jovem chamava-se Adolf Hitler.
À semelhança da Alemanha, na Itália as críticas aos partidos, ao funcionamento do parlamento e aos deputados, ao próprio regime democrático, a crise económica, a crise de valores e de referências são capitalizadas por um orador capaz de inflamar e influenciar as massas, levá-las ao delírio. Dotado de um grande sentido cénico aparece Mussolini.
Em Portugal a I República que chegou a ter três presidentes no mesmo dia está em crise de identidade. De valores. A crise económica e o desemprego levam a um nível nunca visto de emigração. A propaganda fez um homem. Salazar. O resto da história já sabemos.
Nos EUA um homem segue as teorias keynesianas de luta contra a crise. Investimento público, criação do sistema de segurança social, foi lançada a génese do Estado-providência, do Estado social. Foi o New Deal de Roosevelt. A seguir à II Grande Guerra os EUA conheceram uma das épocas de maior prosperidade da sua história. Até Reagan e a mudança de políticas. Já agora, reparem na diferença entre as políticas seguidas na Europa e as dos EUA. Há quase um século e agora. Obama já começou em força o investimento público. A Alemanha começa a reforçar o seu Estado social, enquanto impõe políticas de austeridade à Europa. O diktat de Versalhes é agora o diktat da Troika. Porque a Alemanha jurou nunca mais ter dentro de portas o hiperinflacionismo que a amordaçou antes da II Grande Guerra. As semelhanças com o passado entre esta Europa e aquela de princípios do século XX são assustadoras e muito preocupantes. É bom que os políticos saibam ler os sinais vindos de todo o lado, para já com maior alarme, de Itália.
A propaganda e o populismo que já se pode ver por essa Europa fora, v.g. Grillo em Itália, é um perigo à espreita. O défice de confiança na política e a austeridade castradora de direitos, liberdades e garantias, aliadas à falta de resposta dos líderes em funções, podem levar a uma onda de independentes dispostos a cavalgar a onda da pobreza e da crise. Está nas mãos de quem elege escolher com sabedoria. Para não aparecerem mais grilos falantes a bloquear democracias. E, sobretudo, para que a história não se repita.