quarta-feira, 28 de setembro de 2011

A dieta Thatcher

1- O Estado obeso é a imagem caricaturada que se nos apresenta como meio de justificar os tão apregoados cortes na despesa, SNS, escola pública e no sector empresarial do Estado. O corte nas gorduras do Estado, como um qualquer concorrente do programa da SIC 'Peso Pesado', deveria implicar exercício físico aliado a uma saudável dieta. Ao mesmo tempo que se reduzia na alimentação sem regra, substituindo-a por outra mais saudável e rica, punha-se o Estado a correr e a ganhar músculo. Ora, a receita que nos apresentam, como cura milagrosa, é nada mais, nada menos, que uma lipoaspiração.
A orientação ideológica de Passos Coelho e seus pares, escudada num acordo com a Troika, visa a fragilização do trabalho, ainda que com medidas que possam inclusivamente atropelar a Constituição, vejam-se as novas medidas anunciadas para acrescentar à licitude do despedimento individual (incumprimento de objectivos e quebra de produtividade). Estas medidas a serem aprovadas, de tão genéricas e discricionárias que são, fragilizam as relações laborais e flexibilizam os despedimentos.
Os dividendos, os juros e o capital não são taxados, em primeiro lugar por uma questão ideológica, em segundo lugar porque é mais fácil ir buscar receita ao trabalho da classe média que trabalha por conta de outrem. Os arautos da economia discutiram até à exaustão a famosa taxa Buffet, para eventualmente poder ser aplicada em Portugal, não chegando a conclusão nenhuma, porque a cientificidade empírica do imposto sobre o património era muito difícil de alcançar. Amorim é um assalariado, Berardo tem um empréstimo de 360 milhões na CGD, que pediu para tomar conta da direcção do BCP, amortizável em acções que não valem um rebuçado, e os cortes que nos impingem são feitos nas prestações e nos apoios sociais, na educação, na saúde e na cultura.
A política de privatizações, em vez de fortalecer o Estado, onde ele é mesmo necessário, vende ao desbarato, numa política cega de terra queimada, sem qualquer estratégia, deixando o Estado afastado dos centros de decisão e indefeso do ponto de vista económico. Ex: se venderem a TAP a Espanha, o tráfego para África será feito a partir de Madrid. Ora, África é precisamente para onde Portugal exporta mais. Sem me alongar mais, Águas de Portugal, GALP, REN, e outros case study de um modelo Thatcheriano aplicado 30 anos depois, irão desmoronar qualquer castelo de esperança e atirar-nos para uma profunda recessão endémica, comparticipada a galope do desemprego, da especulação e da crise das dívidas soberanas, que entraram pelo buraco aberto pelos nossos próprios erros e falhas.
Com tudo isto, teremos um Estado balofo, com menos peso é certo, mas sem músculo, deixando a sociedade abandonada à sua sorte, sem confiança nas instituições, porque tudo o que é público, ou não existe ou não tem qualidade. A iniciativa privada terá então a missão de fazer renascer das cinzas um Portugal amordaçado. A fé irracional neste sistema irá desagregar e desestruturar toda a construção conquistada em democracia de um Estado Social mais justo e eficaz. Até porque já se sabe que o nosso tecido empresarial, não é suficiente nem forte, para poder competir com a especulação financeira e com o impasse negligente e a incapacidade da Europa.

2- O dr. João Jardim escondeu deliberadamente as contas. O dr. João Jardim apela ao separatismo e à desordem. O dr. Jardim goza com a cara de toda a gente e ainda se vangloria em orgias de vinho e inaugurações. Se outros deveriam ser responsabilizados criminalmente como ouvi dizer há uns meses, o dr. João 'cratera' Jardim devia ser extraditado para a Venezuela ou para o Irão...
Passos Coelho na entrevista dada à RTP, para além de não ter ideia nenhuma de dinamização da economia, admitiu uma renegociação da dívida com a Troika. Em Junho isso era uma blasfémia... Cavaco continua sereno e calado como habitualmente. Terá engolido algum sapo com sabor a banana?

3- O reality-show da TVI 'Casa dos Segredos 2', é talvez o pior lixo televisivo a que tive «oportunidade» de assistir (sim, consegui perder 5 minutos), feito à base de pessoas semi-nuas em estado de morte cerebral.




quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Carta aberta



Ministério da Justiça
Praça do Comércio
1149-009 Lisboa


Exma. Sra. Ministra da Justiça do Governo do Estado de Portugal

Assunto: Débito/Apoio Judiciário
                 
Exma. Senhora,
Os meus cumprimentos.
Como bem sabe V. Exa., permanece em dívida o valor de 29.770.917,59€, a que acrescem juros vencidos e vincendos que se liquidarão em momento posterior, referente a defesas oficiosas por parte de quase 10.000 advogados portugueses, quantia que V. Exa. se comprometeu a liquidar, o que, todavia, não sucedeu, até ao presente momento.
Com efeito, por várias vezes, contactaram com V. Exa., com vista à resolução extrajudicial do assunto, mas não  se obteve qualquer êxito.
Atento todo o exposto, fico a aguardar o contacto de V. Exa., no prazo máximo de 5 dias a contar da recepção desta carta, para liquidar a quantia supra referida, acrescida dos juros de mora, entretanto, vencidos.
Caso contrário, ver-me-ei forçado a intentar, de imediato, acção judicial contra V. Exas., para cobrança coerciva da quantia em débito, com os inerentes encargos e custos para ambas as partes, sem no entanto prescindir do direito de retenção a que alude o artigo 795º e ss. do Código Civil. Neste caso, reserva-se o direito de não liquidar os impostos devidos até V. Exa. liquidar a dívida supra referida.
Sem outro assunto de momento, reitero os meus cumprimentos e subscrevo-me.

                                               Atentamente,



P.S. Dispõe o artigo 795º do Código Civil: 'O devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza de direito de retenção da coisa que deva entregar se o seu crédito resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.'

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

O mundo em mudança

Onde estava no 11 de Setembro de 2001? O que mudou no 11 de Setembro de 2001? São por estes dias as perguntas mais repetidas. No meu caso, à primeira pergunta, pouco interesse terá a sua resposta. Quanto à segunda pergunta, a sua resposta já poderá ser mais pertinente. Sendo assim, o que mudou no 11 de Setembro de 2001? Resposta: nada ou quase nada. Senão vejamos. Os EUA invadiram dois países, Iraque e Afeganistão, afinal de contas tinham a desculpa perfeita. Lembram-se das armas de destruição massiva? 10 anos volvidos, o bodybuilding americano está feito, não fora a crise económica. O petróleo está mais ou menos controlado, e a indústria de armamento está refeita e próspera. Pelo meio, mataram Bin Laden, aliado de outros tempos, quando dava jeito armá-lo contra a invasão russa do Afeganistão, e mataram também Saddam Hussein, à segunda, porque na primeira guerra do golfo não deu jeito. Ambos executados sem julgamento.
É certo que o 11 de Setembro foi um duro golpe, ou se quiserem, murro no estômago, no orgulho bacoco dos EUA. É certo que morreram muitos inocentes. Morreram muitos mais a seguir.
O que verdadeiramente mudou o mundo foi a crise internacional de 2008. Que começou nos EUA. Coincidência ou talvez não. O que mudou foram as economias emergentes que transformaram o mundo bipolar. A China, o Brasil, a Índia transformaram-se em potências económicas à custa da UE, dos EUA e da Rússia.
O que mudou foi a 'primavera Árabe' de 2011. O despertar da democracia, do diálogo e do respeito. Da tolerância e da liberdade. A demonstração cabal de que é possível ser muçulmano e viver em democracia, como o provam a Turquia, a Malásia e a Indonésia. Aliás a jihad e a Al-Qaeda só agora perderam a guerra, com a rejeição das extensas camadas populares a que se dirige. O terrorismo existirá sempre, mas nunca mais da mesma forma.
O que não mudou foi a política sectária, de interesses e de controlo de recursos. Se a NATO, a ONU e os próprios EUA nada tiveram a dizer na Tunísia, pouco fizeram no Egipto. Já na Líbia, quando o 'amigo do petróleo' Kadafi, ficou em risco de não poder controlar o ouro negro e os seus negócios, o bombardeamento da NATO é uma vergonha só comparável ao silêncio castrador do conflito Israel-Palestina. É só reparar na diferença de tratamento e na atenção dispensadas à Síria. É ver as imagens da visita de Cameron e Sarkozy à nova Líbia e as imagens da visita que não fizeram à Tunísia e ao Egipto.
O mundo não mudou no 11 de Setembro de 2001. Mudou uns anos mais tarde.
Os tempos que vivemos, embora difíceis, são extraordinários. Desde a 'primavera Árabe' e os desenvolvimentos que daí possam surgir (com o impacto que terá na Palestina), passando pelo sim ou sopas da UE, em que assistiremos ou ao seu desmoronamento ou ao seu federalismo, terminando numa nova ordem mundial de capitalismo de estado, com a ascensão da China e do Brasil, e a viragem à esquerda da Europa (ontem na Dinamarca, amanhã na Itália, na França e na Alemanha).
O mundo está a mudar hoje, é preciso saber acompanhá-lo...

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O técnico - parte 2

Paulo Macedo é um técnico e é independente, ou seja, está fora do âmbito da política de carreira. Não que isso tenha qualquer significado pejorativo, mas as pessoas têm tendência para olhar de soslaio para quem faz da política profissão. Aliás, esquecendo-se por vezes, que todos fazemos política de cada vez que a discutimos. E que sem ela a democracia não funciona. Deve sim, criticar-se a politiquice de supermercado, demagógica e populista, assim como aqueles que se servem da política para prossecução de fins pessoais em vez do serviço público.
Continuando, Paulo Macedo foi director geral das contribuições e impostos no governo de Sócrates onde teve óptimos resultados na eficiência dos serviços e por conseguinte, na maior capacidade de cobrança de impostos e melhorias significativas no combate à evasão e fraude fiscais. Até aqui tudo bem. O problema surge, quando se põe um técnico à frente do Ministério da Saúde. Já na pasta das finanças, o técnico é benvindo, se for equilibrado, claro está. Mas na Saúde, as pessoas não podem ser vistas como números. Concordo que se combata o desperdício, que se organize o SNS, para uma melhor eficiência e qualidade dos serviços. Não concordo que se desbarate e destrua o SNS com cortes cegos que irão levar à atrofia da maior conquista da democracia portuguesa. A universalidade do nosso SNS é o mais bem sucedido serviço público de toda a Europa. A agenda liberal do PSD já deixou claro querer acabar com o acesso universal e tendencialmente gratuito, o que implica o pagamento por parte dos cidadãos no momento em que mais necessitarem de cuidados de saúde.
O técnico que só vê números e não pessoas, corta nos subsídios, nas subvenções, nas comparticipações dos medicamentos (os pobres já não podem ter filhos, porque só as vacinas obrigatórias, mais a da meningite vão passar a custar um salário mínimo nacional), aumenta as taxas moderadoras sem distinguir quem pode pagar e quem não pode, e reduz as isenções. O técnico esquece que os acordos e parcerias do SNS com os privados equivalem a 43% do dinheiro gasto com o mesmo. O técnico fecha urgências, corta no transporte de doentes e nos exames de diagnóstico, e corta 50% nos incentivos para a recolha de órgãos para transplantes, sem se importar que Portugal faz parte do top 10 mundial de transplantes e de recolha de órgãos, e sem se importar com o custo que poderá ter em vidas humanas. O técnico não se importa com a destruição do SNS, deixado para os pobres e indigentes, com cada vez menos qualidade e com a fuga para o privado dos melhores médicos a quem o público não consegue pagar salários concorrenciais. O técnico quer e exige resultados. As pessoas vêm a seguir. Não tarda nada, e não sei se não será esse o objectivo, quem tem dinheiro vai ao privado, quem não tem morre no público. Descapitalizar o SNS significa um serviço público de segunda para os mais desfavorecidos, e um serviço privado de primeira, pago pelo Estado, para os mais ricos. Acaba-se com a universalidade de um bom serviço público e financia-se o privado à custa de vidas humanas. Devem ser estes os cortes na despesa que este governo já fez.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

O técnico

O novo Ministro das Finanças, Vítor Gaspar, é um técnico. A expressão utiliza-se quando se quer fazer a distinção para os políticos. Ser político por esta altura poderá não ser um emprego muito popular. Daí que os técnicos independentes sejam à partida uma mais-valia para qualquer governo. Principalmente se estiver a coordenar a 'tentadora' pasta das finanças. Ele aumenta os impostos quase todos os dias, ainda não tomou nenhuma medida de corte na despesa, mas como é um técnico ele é que percebe. É sempre bom ter um técnico a gerir as finanças. Se fosse um político poderia confundir-se com o partido, ou com interesses instalados e agarrados ao poder. Assim um técnico pode usar de uma independência que só a sua qualidade como tal pode ousar exercer. Sucede que, como tudo na vida, poderão existir alguns handycaps. Nomeadamente não perceber nada dos bastidores da política, o que é um claro elogio ao técnico, só que o técnico pode não gostar de dar entrevistas, ou porque não tem a veia propagandista do político, ou porque simplesmente não gosta de estar a explicar verdades insofismáveis aos leigos que o poderão estar a ouvir, ou então porque é simplesmente uma chatice e uma perda de tempo. Poderá também surgir a situação desagradável de dizer aquilo que não convém. Assim, a entrevista que o técnico Vítor Gaspar deu aqui há tempos a um canal televisivo foi confrangedora e embaraçosa, porque o técnico 'não gosta nem tem jeito para dar entrevistas'. Ontem, disse que a situação da Madeira é insustentável. Ora, se fosse político, jamais poria em causa a estratégia de um peso pesado do partido que sustenta o governo. Se fosse político diria que havia um desvio colossal nas contas públicas, mas escondia que um quarto desse desvio vem da Madeira, propriedade do dr. Alberto João.
Senão, veja-se a diferença. O que disse o visado, quando confrontado com um buraco de 500 milhões de euros?
"O que se está a passar foi aquilo que já avisei o povo madeirense: é mobilizar-se a comunicação social do continente, mobilizar-se, agora, até neste caso, os próprios sectores da União Europeia que são afectos à Internacional Socialista e que estão a trabalhar neste grupo da 'troika', a Maçonaria mobilizou tudo quanto podia em termos de utilizar este período para atacar a Madeira".
Aqui temos o exemplo de um político que não é técnico, mas que atira para tudo o que mexe. Assim, mete-se ao barulho a Internacional Socialista e os Maçons, e pode ser que as pessoas se confundam, aproveitando para dar uma facada na esquerda. Confesso que me confundiu com aquela da maçonaria. Se é certo que a troika e as suas medidas são tudo menos de esquerda, a maçonaria não sei quem são, nem o que fazem. Outra explicação é a normal, endividou-se para fazer face à política do Sócrates. Há quem se endivide por necessidade, por desleixo ou por ganância. O dr. Alberto endividou-se, a ele e a nós, porque tem o mundo contra ele, principalmente se for de esquerda. O dr. Alberto não é com certeza um técnico, e o dr. Gaspar não é de certeza um político. Mas o buraco lá está, à espera que os do costume o tapem. Agora, se me dão licença, vou só ali ao banco contrair um empréstimo para alguém pagar.