sexta-feira, 14 de maio de 2021

PRR

A crise social e económica decorrente da pandemia que enfrentamos como comunidade (uns mais que outros), coloca-nos perante desafios e incógnitas tremendas.

Se numa primeira fase as dúvidas se colocavam fundamentalmente em relação aos imprevisíveis efeitos da crise e ao período em que teríamos de conviver com a crise pandémica, hoje as dúvidas que se colocam centram-se particularmente na duração do período de recuperação económica que enfrentaremos, bem como na definição dos adequados mecanismos para a alcançar.

A natureza mundial desta crise conduziu à aprovação por parte da União Europeia de um orçamento e de instrumentos sem precedentes para a enfrentar, numa comunhão oposta à crise existencial que parecia ameaçar o projeto europeu.

Ao contrário do que sucedeu em crises anteriores, as instituições europeias agiram rapidamente, libertando, num primeiro momento, os constrangimentos relativos aos limites orçamentais dos Estados, e, por outro, através do Banco Central Europeu, garantiu o financiamento monetário necessário às economias do espaço europeu. Num segundo momento, o Eurogrupo alcançou um acordo que permitirá a Portugal, entre o Fundo de Recuperação criado para o efeito e o Quadro Financeiro Plurianual, receber cerca de 45 mil milhões de euros a fundo perdido a executar até 2026, podendo ainda recorrer a empréstimos no valor de 10,8 mil milhões de euros do Fundo de Recuperação e Resiliência.

A questão que se colocará a Portugal não é, uma vez mais, a falta de instrumentos financeiros para combater o momento que enfrentamos, mas antes a nossa capacidade como comunidade de construirmos uma visão, um plano estratégico e um eficiente plano de execução desses instrumentos, tais como a requalificação da mão de obra, a capitalização das empresas portuguesas, garantir rendimentos às famílias, aumentar a produtividade, construir um sistema fiscal competitivo no quadro internacional para as empresas e cidadãos e combater o excesso de dependência da nossa economia de dois ou três setores.

O governo tem apostado de forma decisiva em alguns desses setores, inquestionavelmente, muito haverá ainda a fazer.

O combate às desigualdades económicas e sociais crescentes em Portugal também se faz apostando em setores estratégicos do país e que tão bons resultados vinham dando em Portugal. O turismo é um desses setores, e a aposta na TAP é fundamental, como foi quando se reverteu a sua privatização (feita à socapa e em período de transição de governo) em 2015. Ou não fosse a TAP a empresa que mais exporta em Portugal. Dá prejuízo dirão… contabilizem os milhões de passageiros e turistas que traz ou trazia para Portugal, façam uma média de quanto cada um gasta, e depois façam as contas… tenho para mim que uma empresa e um setor estratégico nacional não tem necessariamente que dar lucro.

Também já se percebeu que muita gente (muito longe de ser maioria) não gosta do PS, e principalmente de António Costa, pela ousadia de alargar o arco da governação à sua esquerda, e quiçá ser responsável pelo emergir da extrema direita populista, com o consequente eclipsar do CDS, que por sua vez ganhou uma recente tábua de salvação, numa estranha coligação com o PSD. Com que custos para ambos? Veremos. Nesta conjuntura não se gosta da ministra da Saúde nem da diretora da DGS, não gostam de Cabrita nem de Pedro Nuno Santos. Não se gosta do governo, nem da DGS, nem de nada, ponto. Para eles, façam o que fizerem, ou fazem mal, ou fazem tarde, ou não vão fazer bem… Algumas dessas pessoas vivem numa imensa orfandade política (a ausência do desejado Passos Coelho), ou porque estão insatisfeitas com as lideranças fracas existentes que não chegam a ser alternativa, ou porque Marcelo não lhes trouxe a oposição que nunca poderia ser. Em face da crise gravíssima como a que hoje atravessamos, essas pessoas acabam por ter alguma confiança na experiência e na capacidade de António Costa, mesmo com avanços e recuos, porque ninguém acredita que um governo Rio-Chicão estaria melhor dotado para enfrentar os desafios da pandemia em Portugal.

Também já percebemos, e já aqui o escrevi, que o Plano de Recuperação e Resiliência não chegará ao interior do país como devia, pelo menos para já. Cabe às autarquias descalçar a bota.


terça-feira, 8 de dezembro de 2020

E porque não com gás?


Comprei e li alguns livros de José Rodrigues Santos, confesso. Três. A escrita ligeira e fluída é fácil de ler, principalmente para quem não tem tempo. Ao estilo de Dan Brown, mas em pior. Muito pior. Porque aos inúmeros compêndios de plágios falhados a Dan Brown, consegue juntar uns toques de concorrente de big brother, se a Cristina Ferreira fosse participante e resolvesse escrever um livro aos berros. Acrescente-se uma pitada de alguma investigação sobre um tema mais ou menos polémico/interessante e temos uma mescla explosiva para um 'best seller'.
Só que Rodrigues dos Santos, impulsionado pelos orgasmos públicos a que nos habituou na apresentação do telejornal quando as notícias são más, principalmente se o governo for de esquerda, resolveu reescrever a história.
O mesmo autor da sopa de peixe com leite de mama de uma sueca, que tentou, escreveu e defendeu a tese de que o fascismo deriva do marxismo, tenta agora passar uma borracha no fascismo nazi, numa espécie de truque mágico.
Numa entrevista à RTP, este aldrabão, charlatão, esteve mais de vinte minutos na televisão do Estado a negar o holocausto. E qual é a forma mais soez de negar o holocausto em 2020 se não deturpá-lo e falseá-lo, descontextualizando-o na sua dimensão humanista, Num atentado ao trabalho de milhares de historiadores sérios que dedicaram e dedicam as suas vidas ao tema.
"A certa altura, há alguém que diz 'Epá, estão nos guetos, estão a morrer de fome… não podemos alimentá-los. Se é para morrer mais vale a pena morrer de forma mais humana. E porque não com gás?'". "Ao décimo cadáver que visse já era normal.' 'Já via um enforcamento a palitar os dentes.'
O ignorante afirma que os nazis só gasearam milhões porque não os podiam alimentar, portanto por humanismo.
Rodrigues dos Santos que afirma que nem Saramago ou Lobo Antunes tiveram coragem para escrever sobre o tema, e que foi necessária alguma maturidade como escritor para se aventar a escrever sobre o tema.
Diz o aldrabão que os nazis tinham 50 campos de concentração (eram mais de 44 000), que “os comunistas fizeram a mesma coisa” mas que nos campos nazis ao menos as crianças até iam à escola, que havia piscinas e bordéis e que os presos se habituavam aquilo, que no fundo 'é quase como quem vai para o trabalho'.
Este é o charlatão de Auschwitz... e se calhar por isso é que acaba a entrevista a tentar justificar porque a história contada tem que superior ao estilo... seja como for, ele é um escritor, de literatura...
E porque não com gás?

quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Maradona

O mais genial de todos os tempos. O génio que mais me fez gostar de futebol... com quem aprendi a gostar de futebol, foi hoje sentar-se ao lado dos deuses. A fantasia e o sonho de um puto poder jogar como ele. A felicidade de o ver a dar toques numa bola. A alegria de o ver jogar com a alegria com que jogava. Tenho na memória uma infância/adolescência feliz, também por causa dele. E se me lembro! Que privilégio poder dizer que o vi jogar. Quando se perdem referências, perde-se um pouco de nós, e aquele Maradona foi um pouco de mim e de nós, os que gostam de futebol e não só. E de repente lembro-me de quem via esses jogos comigo. Do meu avô, do meu padrinho e do meu pai. Desses jogos e dessa magia. Lembro-me do Maradona, e de outros, mas sempre do Maradona. 'O futebol é a coisa mais importante dentro daquelas que menos interessam.' Arrigo Sacchi.

Dizem que ninguém ganha jogos sozinho, mas Maradona esteve perto disso. A mão de Deus seguida do golo de todos os golos. O golo do século, dos mundiais, de uma geração. O pé esquerdo de Deus.

A sua vida dava um filme? Vários. Durante a carreira de futebolista e depois dela. Há quem não gostasse, mas só da parte em que punha a boca no trombone. Com drogas ou não. Com álcool ou não. Com Fidel ou na luta contra a corrupção na FIFA. Mais à esquerda como o pé que tinha mais à mão. Imperdoável para os conservadores fofinhos. Imparável fora do campo como dentro dele. Sempre serei Maradona.
Diego não foi um exemplo como homem, viveu nos limites, tal como em cada finta em campo, mas nunca se escondeu, nem foi hipócrita. O jogador do século, com drogas ou máfia, foi aquilo que quis ser... loucos há muitos no futebol, génios não, só há um. Os outros, são os outros, e para mim vêm a seguir.
Percebo algumas piadas dos rapazolas que ainda têm a mania que mandam umas piadas, que ainda acham que mandam umas piadas, mas não entendo... sinceramente... alguns nascem para ser lendas, a maioria nem para uma nota de rodapé.
Até nisso, Maradona continua a ser diferente... ele que sempre foi diferente... melhor...



sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Lava mais branco

O branqueamento do fascismo está em curso. Pior do que isso, é feito por pessoas que não são fascistas, mas que por mero assalto ao poder ou revanchismo ideológico são capazes de normalizar partidos como o Chega.

Há sempre um 'mas'. O que ele disse (Ventura bem entendido), até é racista ou xenófobo, mas... será mesmo necessário facilitar assim tanto? Semana após semana, assiste-se à legitimação do Chega por pessoas de direita que vêm nele uma forma de revanchismo contra o PCP e o Bloco. É por assim dizer, uma nova forma de vingança ideológica. Só que a comparação para além de falsa, é demagógica e ofensiva para a democracia.

Quer historicamente, quer ao nível das propostas, a comparação é disseminada por quem não pode ser honesto intelectualmente.

Da destruição do SNS e da escola pública, ao cerco sanitário a uma etnia, à perseguição a uma minoria religiosa, à reversão da lei do aborto, e a tudo o que já sabemos da visão machista, racista e reacionária que caracteriza o fascismo, até à perseguição aos mais pobres, principalmente os beneficiários de RSI, numa visão redutora e sectária, a castração química de pedófilos e a prisão perpétua, e outras que tais, numa perspetiva de recuos civilizacionais como nunca antes visto, e que qualquer partido da esquerda nunca se atreveu tão pouco, mais ou menos, a propor.

O PSD nos Açores cruzou uma linha vermelha. No resto do país espero que não, se bem que já sabemos onde cairá Rui Rio se disso necessitar. Triste e perigoso porque ajuda a enfraquecer a democracia e mina por dentro o sistema de que estes populistas se aproveitam.


sábado, 7 de novembro de 2020

B(ye)den

Se há boas notícias em 2020, a derrota do populismo delirante, xenófobo e racista é uma delas. A América será 'great again'...

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Stayaway Covid

 

Já sabemos de cor e salteado todas as possíveis contradições existentes nas medidas de combate à pandemia Covid-19.

Também sabemos tudo o que há para saber sobre as regras aplicadas e aplicáveis.

Mas há uma coisa que não sabemos: respeitá-las e acatá-las. Para o bem comum. Criticar sabemos, obedecer nunca.

Porque tudo é fácil, mas aposto que no lugar lá onde eles estão, a infernizar-nos a vida, teríamos com certeza o bom senso e a sabedoria para aplicar medidas bem melhores. Porque nós sabemos tudo o que há para saber sobre a Covid-19. Eles, leigos, não. Ou, porventura, não aplicar nenhuma e dizer à populaça que isto mais não é do que uma gripezinha.

Quanto à mais recente polémica da aplicação 'stayaway covid', mais uma vez a informação, ou neste caso, a falta dela, tem dominado as discussões facebookianas e não só dos peritos em epidemiologia.

Mas vamos por partes. António Costa propôs à AR que aprovasse o uso obrigatório de máscara na rua e a instalação obrigatória nos telemóveis da aplicação 'stayaway covid'. Dito assim, o ditador Costa, foi comparado aos piores sistemas ditatoriais do mundo, essa esquerdalha malvada da China, Cuba, Rússia, Coreia do Norte e Venezuela. Porque, como se sabe, não existem nem nunca existiram ditaduras de direita. E mesmo enviando a proposta à AR, esse espaço ditatorial em qualquer país civilizado que se permita tê-lo como instituição mais ou menos democrática, não se livrará da fama.

Só que é assim? Não, não é bem assim. A proposta refere o uso de máscara obrigatória para pessoas com mais de 10 anos, nos espaços ou vias públicas, e sempre que o distanciamento físico recomendado pela DGS se mostre impraticável. Totalmente de acordo…

Quanto à aplicação, ou a app para os mais modernaços, a proposta é que seja obrigatória a sua instalação em contexto laboral ou equiparado, escolar e académico e por possuidores de equipamento que o permita. Ou seja, não se aplica aos reformados, não se aplica a quem não tenha equipamento compatível, não se aplica a muita gente que se apressou a criticar sem saber do que estava a falar. O normal, portanto.

Outra coisa bem diferente, é saber da constitucionalidade de tal proposta, e refiro-me só à que diz respeito à aplicação, porque quanto ao uso da máscara, tal questão não se põe. O estado de calamidade permite isso, e muito mais.

A instalação da aplicação, mesmo nos casos acima descritos, parece-me inconstitucional, e mais será a sua fiscalização por agentes de autoridade. Por isso, é que Costa se precipitou.

No entanto, muitos dos que se apressam a ir ao facebook dizer umas coisas, deviam estar mais preocupados com as definições de privacidade dessa rede social e de outras, do que com a aplicação 'stayawaycovid'. E já agora, instalá-la se tiverem bom senso. Não devia ser necessário ninguém sugerir a sua obrigatoriedade. Que, repito, é inconstitucional, na minha opinião, mesmo em período de estado de calamidade. 


terça-feira, 29 de setembro de 2020

Chega!

Eles andam por aí, mais do que se imaginaria, agora identificados numa voz pela qual ansiavam e que lhes dá os motivos para espalhar o seu ódio contra o regime. Uma horda boçal que não admite regras nem razões. À míngua de argumentos e conhecimento, arrasam com ignorância tudo e todos, apontando o dedo a qualquer falha do sistema sem nunca terem contribuído com nada que não seja o bota-abaixo.

Mas o Chega e a sua horda combatem-se com a falácia dos seus próprios argumentos, ou da falta deles. É na política do populismo que se apanham as incoerências de quem está disposto a tudo e ao seu contrário para ser eleito e tentar minar por dentro o regime que o elegeu. Se uma das razões do voto é a insegurança social, exibe-se o programa de que o Chega tem agora vergonha, onde se propõe a total privatização do SNS e da Escola Pública, a desregulação laboral e a redução drástica dos impostos para os ricos. O Chega que após ter eleito um deputado andou a apagar e a emendar as incoerências do seu programa eleitoral. Se esse voto é por causa do descrédito da política, confronta-se com a pensão vitalícia que o porta-voz Sousa Lara recebia ou do candidato às europeias que é arguido por alegada burla ao Estado.

Compreender as razões do voto na extrema-direita é um grande passo para a poder combater, não lhe dando, no entanto, o palco que não merece. As razões desse voto são variadas: o processo de globalização que, tendo afastado a matriz social da ação política, expulsou milhões de cidadãos da promessa de oportunidades de progresso; a crise financeira de 2008 com a consequente retirada de poder aos Estados e uma distribuição entre trabalho e capital cada vez mais desigual, o esmagamento das classes médias, sem as quais a extrema-direita historicamente nunca vinga; e uma crise de estadistas que tornou a manipulação muito mais fácil. Estamos a falar de um novo tipo de extrema-direita, que hoje integra a agenda neoliberal da elite económica e a que não é alheia uma comunicação social decadente, feita do jornalismo do imediato e do direto.

Mas, mesmo compreendendo as origens deste voto, a democracia não pode deixar de ser clara nos limites que impõe. As democracias devem ser implacáveis sempre que estas organizações tentem subverter as instituições do Estado, utilizem as forças de segurança como escudo, ou usem, de forma anónima, as redes sociais para espalhar o ódio e a difamação. A democracia e os seus intérpretes não podem ceder à chantagem, populismo e manipulação. Armas de quem se aproveita do desespero e da insatisfação, por vezes legítima, dos cidadãos, e a quem o sistema não consegue dar resposta. Atuando neste domínio, o espaço para a proliferação destes ‘bolsonaros’ fica reduzido. Quanto às redes socias, o espaço é amplo para a libertinagem de expressão, e aí o combate faz-se com desprezo, quase sempre.